The Monsoon of which I speak about is more than a storm system...; it is, too, a life affirming and beneficial climatic phenomenon, so necessary over the centuries for trade, globalization, unity, and progress.
Robert Kaplan, "Monsoon: the Indian Ocean and the future of American power"
África está num ressurgimento de importância. De uma forma ainda difusa existe algo que se está passar. Aquilo que foi no século XIX o “Great Game”, essa competição por recursos e presença geográfica entre Grã-Bretanha e Rússia no triângulo que vai do Hindu Kush, Mar Negro e as planícies da Ásia Central, desenrola-se hoje em África ditada pela procura de commodities para alimentar a voragem das novas potências econômicas do Oriente encabeçadas pela China. Mas não é só a China que está nesse jogo. Ainda no ano de 2011, a Índia aprovou a criação de uma agência de desenvolvimento e cooperação que tem como objetivo colocar a Índia no mapa de África. Tendo perdido para o seu grande competidor alguns espaços cruciais de matérias-primas mais perto de casa como é o caso da Birmânia, a Índia pretende que a história não se repita em África. A outra grande potência emergente, o Brasil, procura também ocupar o seu espaço no Continente alavacando as suas ligações por via do mundo da língua portuguesa para garantir uma presença mais próxima do seu mercado principal, a China. Este processo de aumento da importância do continente africano teve a sua origem com aquilo que os economistas classificam como “commodity super cycle” que se iniciou no virar deste século. Temos mais uma daquelas coincidências que nos faz pensar que este século tem características muito parecidas com o fim do século XIX e início do século XX. Uma potência ainda dominante, mas perdendo a sua hegemonia (na altura o Reino Unido, hoje os Estados Unidos), uma potência hegemónica em ascensão, mas ainda incapaz de assumir liderança (na altura os Estados Unidos, hoje a China), corrida aos recursos naturais numa ótica mercantilista, emergência do fenômeno terrorista como instrumento de intimidação da população civil (na altura com a bandeira do anarquismo, hoje com a da religião) só para citar algumas semelhanças.
Voltando a África este renovado interesse sobre o continente surgiu em boa hora, pois se houve continente que perdeu claramente com o final da guerra fria foi o continente africano que se viu condenado à marginalidade política e ficou isolado da enorme vaga da globalização que se iniciou nos anos 90. É bom recordar que todo o processo de independências no Continente ocorre tendo como pano de fundo a disputa entre Estados Unidos e a União Soviética que procuravam arregimentar para o seu campo os novos países que surgiam fruto da descolonização. Finda a Guerra Fria, a África caiu na gaveta dos fundos da geopolítica, ganhando visibilidade apenas de quando em quando por algum acontecimento capaz de atrair a curiosidade dos media como a eleição de Nelson Mandela, o genocídio do Ruanda, só para citar dois exemplos. Com a independência tornou-se também evidente o caráter superficial da colonização, que apenas foi plena nos últimos 50/60 anos da sua existência, expressa na imensa diferença entre a capital e o mundo rural da generalidade dos países africanos e o esforço administrativo muito acima da sua capacidade em criar uma unidade administrativa nos seus territórios. A Costa do Marfim e a Nigeria, para dar dois exemplos, quiseram ligar artificialmente esses dois mundos criando uma nova capital, Yamassoukro e Abuja, no interior dos seus países, pretendendo substituir as suas antigas capitais e verdadeiros centros de comercio na costa, Abidjan e Lagos. Falharam neste objetivo e esta dicotomia e desconexão entre cidade, sobretudo a capital, e o mundo rural foi durante décadas das características mais disfuncionais da realidade política, económica e social africana.
Em vários planos esta realidade está em mudança. Em termos políticos, a morte da geração de líderes educados pelo regime colonial que encabeçaram a luta pela independência fez emergir toda uma nova classe política mais comprometida com o desenvolvimento econômico. Por outro lado, a alteração dos termos de troca de muitas economias africanas, com o aumento de preço dos recursos naturais e agrícolas, finalmente está permitir a constituição de um excedente econômico no mundo rural que permita suportar uma maior urbanização necessária para a solidez administrativa e política destes países. Também a tecnologia tem desempenhado um papel fundamental ao permitir o encurtar de caminho para o desenvolvimento econômico. Por exemplo, antes da cobertura de telefone fixo na totalidade do território, muitos países africanos conhecem o telemóvel disponível nas suas zonas mais remotas. O Quénia possui dos sistemas de mobile banking mais avançados do mundo. Durante alguns anos, pensou-se que o ressurgimento de África passaria, sobretudo pela África do Sul, uma economia maior que o resto da África subsaariana toda junta. Sem desprezar a importância do país, hoje a história gira principalmente a partir do ressurgimento do Índico enquanto pólo de comércio retomando a sua importância econômica que vêm de antes do Império Romano. No arco que começa em Durban, sobe pela costa leste africana, e percorre todo o Índico até à Indonésia existe uma tradição de comércio que se estendeu na região de mãos dadas com o Islão, uma diáspora empreendedora de origem indiana com laços familiares e culturais que atravessam todo o Índico. É a partir da costa Oriental africana que os imensos recursos naturais do centro do Continente irão ser escoados para alimentar o crescimento de toda a Ásia, em particular os colossos chinês e indiano. Nesta nova geopolítica, e olhando para o mundo da língua portuguesa, Moçambique é um ator bem mais central que Angola. A globalização não chega pois à África. Regressa a ela pelos mesmos caminhos trilhados durante séculos ao ritmo das Monções que faziam ser mais rápido cruzar o Índico do que o Mediterrâneo. Esta é a nova fronteira do desenvolvimento económico.
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