Sunday, December 16, 2012

E o depois da crise? - Jornal Público 16/12/12


"...é como estar num quarto sem janelas: existe só uma razão para a escuridão, mas muitas maneiras de trazer a luz"
Yan Xuetong, Ancient Chinese thoughts, modern Chinese power


De tanto se falar de crise, de dívida, do Estado, de impostos e de despesa cai no esquecimento que nenhum destes fatores é a solução para o depois da crise. Não sairá daqui a retoma da criação de riqueza nem em Portugal, nem na Europa nem nos Estados Unidos da mesma forma que a água que e utilizada para apagar um incêndio não reconstrói o edifício vitima do mesmo. Quatro anos depois da queda da Lehman Brothers, continuamos mergulhados no ciclo de encontrar os culpados, ignorando que esta crise é como um crime do expresso do oriente no plano económico. Todos tinham o motivo e tiveram a oportunidade de golpear a vítima. Os consumidores sobre-consumiram, as empresas sobre-investiram, os Estados sobre-gastaram e os bancos tudo financiaram. Mas a solução para o futuro passa por todos eles voltarem a fazer o que sempre fizeram, mas sem o "sobre" antes. Este ciclo de expiação diz-nos, contudo, alguma coisa sobre o futuro. Ele diz-nos que a competição política pelos recursos (mais) escassos das diferentes nações, vai ser de grande ferocidade e que os sistemas políticos das chamadas democracias liberais do Ocidente irão ter grande dificuldade em arbitrar os diferentes grupos de pressão e de interesses. É que num contexto de crescimento moderado e sem o colchão do aumento da dívida, não será possível satisfazer todos os setores da sociedade ao mesmo tempo como até aqui.

Desenganem-se também aqueles que pensam (e são muitos) que a presente crise representou a falência das idéias liberais, do chamado consenso de Washington, e que agora será a altura dos estados iluminados tomarem a rédea do desenvolvimento das nações, sendo o sucesso da China a comprovação deste novo axioma. É que esta teoria tem vários problemas de consistência. Em primeiro lugar, porque os excessos que levaram a 2008 nada tiveram de liberal, mas sim tiveram na base falhas humanas antigas, perenes e ausentes de ideologia como a cobiça e a miopia em face de riscos crescentes. Como resumiu há uns anos o ex-CEO do Citibank, Charles Prince, "enquanto a música tocar, temos de nos levantar e dançar". Por outro lado, a China é a China. Desde há muito séculos, que a capacidade administrativa chinesa de produzir política pública de qualidade teve sempre acima de qualquer suspeita. O problema da China sempre foi outro. Foi o problema do "mau imperador" do qual Mao foi o último exemplar. Sem limites claros ao exercício do poder, a chegada ao poder de um "mau imperador" produz danos de grande magnitude no sistema, tendo levado mesmo em alguns momentos da história a interrupção da sua existência enquanto nação independente. Exportar este iluminismo burocrático foi relativamente fácil na Ásia, como comprovam os casos de Singapura, Malásia e Coréia do Sul. Como o Brasil hoje descobre às suas custas, é bem mais difícil em países sem a mesma qualidade administrativa de base.

Europa e Estados Unidos vivem hoje problemas simétricos embora semelhantes. Um não consegue deixar de gastar, o outro não consegue começar a taxar. Em ambas as regiões parece que a solução dos problemas atuais começa e acaba em definir o raio de ação do Estado e que depois tudo se resolve. Para além de isto ser só muito parcialmente verdade, esta discussão esconde até que ponto os principais atores sociais com capacidade de mobilização foram "comprados" na Europa por via do chamado estado social (e da despesa pública) e nos Estados Unidos (dado o seu "nojo" protestante ao gasto) através das isenções fiscais que transformaram o sistema de impostos no país num imenso queijo suiço. Em ambos os casos, a vitalidade e a eficácia das democracias está em jogo se elas não forem capazes de propor soluções que tenham em mente a criação de condições de criação de prosperidade e ao invés continuarem presas a um jogo redistributivo de um bolo que mesmo que não seja minguante é pelo menos estagnado.

Mesmo que resolvido o problema acima, fica ainda por responder a parte mais importante da pergunta. Como retornar ao caminho do crescimento e da prosperidade que o mundo ocidental conheceu de forma quase ininterrupta nos últimos 80 anos. Em primeiro lugar, retomar o curso da liberalização de comércio a nível global é fundamental. Esta era uma parte importante da agenda para o crescimento saída das reuniões do G20 de 2009 mas que entretanto foi colocada em "banho maria". Foi a liberalização do comércio do pós II Guerra Mundial que mais fez pela saída da pobreza de milhões de indivíduos que hoje consomem, produzem e investem em todo o mundo sendo que existem muitos milhões mais esperando pela sua oportunidade. Como outro pilar, temos a mobilidade das pessoas, a emigração. No mundo de hoje, a competição pelo talento é dos aspetos mais fundamentais do sucesso quer ao nível de países quer ao nível das empresas. E esta é a grande vantagem do mundo dito Ocidental sobre os restantes. A sua capacidade de atrair talento de todo o mundo para estudar e trabalhar no seu seio. Ver o grau zero da política a que chegou a discussão da imigração na Europa, mas também nos Estados Unidos, é dos aspetos que mais me faz temer pelo crescimento económico potencial a longo-prazo de ambas as regiões. Para Portugal, e para deixar uma nota particular sobre o nosso país, existe aqui ainda um desafio suplementar que é transformar a sua sociedade numa de cariz bem mais meritocrático. O país como um todo vê hoje ainda o talento com desconfiança, o sucesso com inveja e a mediocridade submissa com estima. Sem mudar isto, e para utilizar uma imagem do futebol, teremos sempre, como é lógico, bons jogadores mas falharemos inevitavelmente como equipa.

Aguardo. Nem que seja por uma vela.


Monday, December 10, 2012

A thought on Chinese leadership- pm post

In the past an invader and empire, now a balancing power


" We are looking for balancing factors in the region and Japan could be a significant balancing factor", Albert del Rosario, Philippine's foreign minister

It is known that for every action, there is a reaction. Chinese assertiveness is starting to find this out as it claims more aggressively parts of the South China Sea and its neighbours turn to Japan as a countervailing power. With the Japanese going to vote soon  and the role of Japan's Self-Defence Forces an issue in the election we might be looking at a (one more!) really hot geopolitical spot in the world.

As Chinese leaders start to flex their muscles and betting on regional hegemony, it makes a sober reading the book "Ancient Chinese thought, modern Chinese power" by Daniel Bell, Yan Xuetong and Sun Zhe. By looking at the thoughts pre-Qin masters (770-476 BC and 475-221 BC) - Guanzi, Laozi, Confucius, Mencius, Mozi, Xunzi and Hanfeizi - Yan Xuetong, a leading chinese foreign policy thinker (some call him the Chinese most preeminent neocon) tries to meld them into modern foreign policy theory and give a direction to the ascent of China as a world power. And I say sober, because as Yan puts it, "...only when the international community believes that China is a more responsible state than the United States will China be able to replace the United States as the world's leading state. Whether a state is a responsible major power is not something that the state itself can decide; it is a matter of judgement by other states".

Or as Laozi said "the sea is a master of a hundred rivers only because it lies low". The rise to power is never easy as Wilhelm Germany (after discarding the prudent Bismark) discovered to its ruin. The United States rose to power by being a reluctant hegemon for 40 years and by tying itself to rules that limited its power after the second world war. One could add still that the diminished US power accelerated in the Bush years by openly flouting those same rules. So, if you want to lead there are lessons aplenty on how to do it.  

Tuesday, December 4, 2012

Dark corners - am post

Oh my god! Not those Portuguese reporters again!

Last week: Jean-Claude Juncker, President of the EuroGroup and Prime-Minister of Luxembourg, addresses the press after the last aid package to Greece, saying that "more than a year ago, we took the decision that conditions applied to one country should be applied to all. This matter is going to be dealt with in our next meeting".

3rd of December (the next meeting he was speaking about): Jean-Claude Juncker again. "I am not under the impression that the EuroGroup can apply the same conditions (of Greece) to other countries (meaning Portugal and Ireland)".

Justification of Jean-Claude Juncker for this apparent contradiction: "I was surprised by Portuguese reporters in a dark corner and in uncomfortable circumstances. I didn't quite understand the question."

Conclusion: Besides unveiling a little bit what can happen in dark corners at European press conferences, I am still trying to understand the underlying logic of this policy statement. Let me have a go. Basically it means that to be saved from falling in the same hole Greece is in, you have to be in the same hole Greece is in. Amazing logic.

Sunday, December 2, 2012

A propósito do Levante




"The Levant is an area, a dialogue and a quest."

Philip Mansel, Levant, Splendour and Catastrophe on the Mediterranean


Reparei que ainda não tinha falado sobre o Levante, afinal parte do sub-título deste blog. Este acaba por ser um post mais pessoal, pois o Levante cruza-se comigo, com a minha vida e com o meu passado de uma forma profunda e devo dizer também imprevisível.

O Levante para mim é um local de encontro, físico e espiritual. Tem a sua origem na palavra francesa despertar - levant - e ficou associado, no Ocidente, às terras onde o sol nascia, englobando aquilo que é hoje a Grécia, Turquia, Síria, Líbano e Egipto. Um nome ocidental para uma região oriental. Nada mais apropriado. O nexus de um encontro civilizacional, entre o mundo Greco-Romano e as civilizações do Oriente, sobretudo a Persa e a Otomana, e de um encontro religioso entre Cristianismo, Judaísmo e Islão. Saindo das suas raízes regionais,engloba, na minha história, mesmo todo o Mediterrâneo olhando para este mar como caldo de fusão de identidades entre as suas margens Norte e Sul. E é precisamente este que é para mim o ponto de partida para aquilo que é o espírito do Levante.

A primeira vez que tomei contato com esta realidade foi quando aos 15 anos li Leão, o Africano de Amin Maalouf. O romance sobre a vida de Joannes Leo Africanus, ou al-Hasan ibn Muhammad al-Wazzan al-Fasi em Árabe, foi uma porta que se abriu para mim sobre o mundo do Mediterrâneo dos século XV e XVI. Nascido em Granada em 1494, é obrigado a fugir para Marrocos fugindo da vaga de repressão na Península no seguimento da reconquista e o fim do Reino de Al-Andaluz, que culminaria um século e meio mais tarde com a eliminação da Península das suas populações judia e muçulmana. Como iria acontecer séculos mais tarde em Smirna (hoje Izmir) ou Alexandria, o fechar das luzes sobre estas regiões de miscigenação entre Oriente e Ocidente, Levantinas em espírito, acarrateria perdas irreparáveis para ambas as partes. Nunca mais o Islão teve pensadores ao nível de um Averroes (a quem devemos não só conhecer Aristóteles como, ironicamente, se pensarmos na imagem de hoje do Islão, a libertação da filosofia e ciência dos constrangimentos da religião) ou Ibn Khaldun e a Península perdeu para sempre um dos seus principais fatores de dinamismo económico. A vida de Al-Hasan é depois um autêntico fresco sobre o Mediterrâneo da época. Contemporâneo da queda dos Mamelucos no Egipto (essa casta de escravos guerreiros a quem o Islão deve a sua existência por via da sua resistência vitoriosa contra as invasões Mongois) a favor do Império Otomano, viaja por toda a região sendo mais tarde capturado, batizado e adotado pelo Papa Leão X.

Averroes: odiado pelos fanáticos islâmicos, esquecido no Ocidente

Este livro, e a história do seu personagem, marcaram-me profundamente. Quando vinte anos mais tarde, descobri em Cabo Verde as origens da minha família, voltei a reler o livro e senti-me um pouco parte desse período onde o Mediterrâneo não era mar mas apenas um rio raso que se atravessava facilmente de uma costa para a outra.  Como breve pausa desta história sobre o Levante, falo pois sumariamente da minha. Ao chegar a Cabo Verde em 1997 para trabalhar no Governo do país, esbarro no aeroporto do Sal com a placa de inauguração do terminal e com o nome completo do então Primeiro-Ministro, Carlos Alberto Wahnon de Carvalho Veiga que eu apenas conhecia dos jornais como Carlos Veiga. O seu apelido Wahnon levou-me a descobrir toda uma dimensão da história da minha família que desconhecia até então. Com as suas origens perdidas no tempo, de antes da conquista de Marrocos pelos Árabes, enquanto tribo judia berbere de Tetuan, a família Wahnon, como os Cohen, Levi, Benoliel e outros, sai de Marrocos no século XVIII, para Gibraltar, Cabo Verde, Portugal e o resto do mundo. Anos mais tarde, casado com uma mulher de origem marroquina e de confissão Muçulmana, não deixo de sentir, pois, um fechar de círculo sobre a minha leitura de adolescente de Leão, o Africano. 

O Levante tem um espírito, mas também uma raíz geográfica. Ficou para sempre ligado a cidades como Smirna, Salónica, Alexandria, Jaffa e Beirute. Enquanto expoentes máximos do cosmopolitismo, estas cidades precisaram sempre de um Império para as proteger. Na verdade ao longo da história, os Impérios foram mais vezes uma força de progresso e de contenção das pulsões de barbárie do ser humano do que de simplesmente tirania, como estamos hoje a descobrir amargamente com o ocaso do Império Americano. O fim dos Impérios ditado pela Primeira Guerra Mundial, e o explodir do nacionalismo em toda a sua fúria faminta, condenou estas cidades à extinção do seu caráter multicultural e por esta via as amputou da sua importância cultivada ao longo de séculos. Hoje Izmir é uma cidade turca, Salónica Grega, Jaffa israelita e Alexandria Egípcia. A diversidade destas cidades é hoje apenas vislumbrada nos seus cemitérios e nas suas campas. Só Beirute ainda resiste no fio da navalha. Jantar em Beirute na casa de uma família libanesa e passar a refeição a assistir à discussão saltitar do inglês para o francês e árabe e vice versa, é um registro (e deleite) de tempos passados tal como a competição na hora das preces entre o repicar dos sinos das igrejas e os cânticos dos muezzin. Hoje estas múltiplas identidades que eram características do Levante, são ao mesmo tempo crescentes em toda uma camada da população mundial que partilha, de Shangai a Nova Iorque, a mesma educação e base cultural, e mais vulneráveis aos fanatismos identitários que são a defesa dos muitos que se sentem fragilizados pela globalização. Na verdade, se fizermos um pequeno grande salto comparativo, hoje o espírito Levantino encontra refúgio em cidades como Nova Iorque e Londres, cidades dinâmicas, multiculturais e verdadeiros centros da elite globalizada. Para imaginar a queda (e a perda) das cidades do Levante, basta apenas imaginar como seria Nova Iorque e Londres se elas fossem apenas uma cidade norte-americana ou inglesa. Mas da mesma forma que os habitantes da corniche em Alexandria, árabes, arménios, judeus, italianos entre tantas outras origens da cidade, desconheciam o que fermentava nos subúrbios pobres da cidade, hoje, por vezes, esquecemos quanto alguns equilíbrios dos quais dependemos são igualmente frágeis. Porque cruzado com ódio à multiplicidade de identidades que derrubou o Levante, temos esse ódio ancestral ao cosmopolitismo. Da história de Sodoma e Gomorra ao romantismo alemão de Thomas Mann, sempre a cidade foi vista como centro de bastardização e corrupção de um ideário de homem puro, do campo e ligado às suas raízes ancestrais e vivendo numa sociedade idealizada virtuosa como existe no imaginário do salafismo dos fanáticos islâmicos. Judeus e arménios conheceram a perseguição nos século XIX e XX, entre outras razões, precisamente por serem protótipos perfeitos do homem da cidade, de profissão liberal e que não produz nada de real. De tão integrados que estavam na vida de muitas cidades alemãs  que muitos judeus apenas realizaram a sua condição judaica a caminho dos campos de extermínio. Não é por acaso, pois, que o ataque do 11 de Setembro teve como alvo Nova Iorque e os prédios do World Trade Center, essas verdadeiras Torres de Babel dos tempos modernos. E das consequências mais perniciosas deste evento para os Estados Unidos e a sua prosperidade, foi o fechar da sua política de imigração traduzida nas inúmeras dificuldades que hoje enfrentam cidadãos de todo o mundo para estudar e trabalhar no país. Os instrumentos da globalização carregam, pois em si, quer a possibilidade de conectar de forma indissolúvel toda uma camada da população mundial, proporcionando a troca cultural e a execução de negócios à escala global, como unificam a ligação e a força dos que a ela se opõem por todo o globo. Estas tensões conhecem também uma expressão aguda na Europa, onde a necessidade de acolher imigrantes por via da sua decadência demográfica e baixo nível de dinamismo económico convive hoje com incapacidade de transmutar a identidade étnica europeia em algo mais abrangente e universal capaz de integrar com sucesso as segundas e terceiras gerações de imigrantes. A este título, ter perdido definitivamente, a meu ver (pois hoje a elite turca já não vê no caminho europeu algo de interessante e viável), a oportunidade de trazer a Turquia para o seio da Europa é  dos erros políticos que pagaremos com juros mais altos no futuro.

History repeated

O diálogo como parte integrante do espírito do Levante não é acrítico nem passivo. Ele é crioulo porque fruto da mistura. Ele é, na sua essência, como diria João Paulo II, "not an exchange of ideas but an exchange of gifts". E esta vitalidade faz dele, não só imensamente enriquecedor e uma verdadeira mola para o progresso, como, também infinitamente frágil e vulnerável tão visível nessa história esplendorosa e trágica das cidades do Levante.  

Friday, November 30, 2012

Future, past and present - am post


And they thought that just cheap money was enough....

"Throughout history, rich and poor countries alike have been lending, borrowing, crashing - and recovering - their way through an extraordinary range of financial crises. Each time, the experts have chimed, this time is different, claiming the old rules of valuation no longer apply and that the new situation bears little similarity to past disasters."

Kenneth Rogoff & Carmen Reinhart, This Time is Different

As Japan approves its nth stimulus package trying to avoid its fifth recession in 15 years, one wonders what did the rest of the world learned about Japan's experience of the past 25 years. Let me see. Avoiding contracting prematurely fiscal policy? No, everybody did that and we are still trying to do more on this one. Delaying financial sector restructuring? Welcome to the brave Euroland. Thinking that exports will save you? Again everybody, and hopefully if this fails we can still export to the rest of the Galaxy.

Never say one has learned a lesson....  

Tuesday, November 27, 2012

Contrast of the day: England vs France - pm post

I will still be working for the Queen......


While England chooses a foreigner (I know Mark Carney is Canadian but nevertheless...) for its most important unelected post....


Give me just one minute and I will kick Mittal's b...

...France, through its Ministre du Redressement Productif ( a fantastic title but clearly nobody explained to him that to increase production you need companies and those pesky foreign investors) threatens with nationalization Arcelor's assets in France and with expulsion from the country of its main shareholder, Lakshmi Mittal.

Do I need to say anything more?




Photo of the day - am post

Monday, November 26, 2012

The ABC of minute taking - pm post


The purpose of minutes is not to record events but to protect people

Humphrey, Yes Prime Minister

Because yesterday, on my post, I touched on the Yes Prime Minister show, I could not resist in sharing today the very secret of good minute taking.

Molt més que un Estat - am post



Com a eleição de ontem na Catalunha, uma previsão se concretizou e outra ameaça se realizar.

Começando pela que se concretizou. Há algumas décadas, vários analistas previram que a União Europeia colocaria os seus Estados constituintes numa "sovereign sandwich". Perdendo soberania por cima e se desintegrando por baixo. Se olharmos para os Estados Europeus que são de alguma forma multinacionais vemos que esta previsão acertou na mouche. Espanha, Reino Unido e Bélgica enfrentam esta realidade. A Bélgica nem vale a pena falar já que há muito deixou de ser um país, para ser apenas um daqueles casamentos onde o casal apenas vive na mesma casa porque é muito caro mudar para outra. Estão juntos apenas para ver a seleção de futebol jogar e para cantar parabéns a você ao Rei. O Reino Unido caminha a passos largos para um referendo sobre a independência da Escócia. E agora a Espanha.

E quanto à previsão que ameaça realizar-se? Bem, um dos argumentos dos independistas catalães é que estão fartos de pagar a conta do resto da Espanha, em particular dos preguiçosos das regiões mais pobres como a Andaluzia. Sounds familiar? Pois é. Referendar o apoio a regiões mais pobres de um Estado multinacional é algo que pode ser bem apelativo para os eleitores alemães, finlandeses e holandeses quando eles olham para o financiamento da Grécia, Portugal e Irelanda. Assim, o referendo da Catalunha pode ser apenas o primeiro de muitos na Europa. Se a moda pega....















Sunday, November 25, 2012

The CEO myth in politics


It is frequently a misfortune to have very brilliant men in charge of affairs. They expect too much of ordinary men.

Thucydides

With the dust settled on the last American election, let me return to it and to what are, at least for me, some intriguing facts about its result. First and foremost is what I call the myth of the CEO in politics. In the present economic circumstances, Romney appeared to have the perfect CV. Successful entrepreneur, outstanding manager in difficult circumstances. In one word: the fixer. The perfect CEO in chief. What appeared ideal on paper, however, didn't sway the American public. The second aspect, is what does the whole process tell us about the selection process of our leaders. Not only in the US but elsewhere in the Western World. My belief is that there is a growing disconnect between the qualities necessary to run successful campaigns and the qualities needed to govern and that the selection pool in politics is experiencing a significant deterioration in western democracies.

Before, just one word about the outcome of the US election. A lot has been written about how the Democrats are poised to win every election given the new demographics of the country. The same thing was written after the 2004 election, but in that case for the benefit of Republicans. I don't think either prediction is true. In this election, minority vote went up but...many white voters also stayed at home. On the other hand, voting allegiances of entire ethnic groups can change over time. Prior to the 60's, the party of blacks used to be the Republican one given its anti-slavery past. With Johnson, and the civil rights legislation, the Democrats gained the blacks but lost the South. So things can change in a very dramatic way. Also, Obama is both black and son of an immigrant. Those two characteristics are difficult to replicate at the same time in the future. So sorry to disappoint, but elections will most probably continue to be hard to predict. More worrisome for the US (and the world) is, however, that governing is increasingly difficult in a country where only the presidential election  is won on the political center but even here the outcome is increasingly dependent on base turnout and not on swing vote which, by the way, Romney won handily. Also, in Congress, especially in the House due to the redistricting process of the last 30 years, only a small percentage of elections are truly competitive meaning that most representatives are radicals from both parties and thus hardly prepared (and open) to the art of compromise necessary to elaborate and implement policy. Both factors are an expression of the increasingly polarisation of the political scene and they will make solving the challenges that the US faces much harder to overcome. I will leave it for now as this whole theme deserves a much deeper analysis but don't fool yourselves: Obama second mandate will most probably disappoint the same way the first one did.

Let's go back to the CEO myth. At first glance, CEOs and entrepreneurs (let's concentrate on the successful ones of course) seem to have the skills and the experience to be outstanding Prime Ministers and Presidents. They are familiar with the need to make decisions, are used to manage large organizations and different constituencies (shareholders, employees, etc...) and they have a work rate beyond any reproach. The actual record of CEOs in power is however much less encouraging. Romney, for example, had a much less stellar performance as Massachusetts Governor than he pitched during the election which showed in the huge loss margin against Obama in that same state.




Do we need to speak about the performance of Berlusconi in Italy? That's a quick one. The other example is Pinera in Chile who also received few praises for its performance in office. And what explains this phenomena? As with most complex things in life, there are several factors that can explain each and every one of these cases. Also, governing in modern democracies has become much harder for anyone, CEO or not. The extreme media pressure and exposure and the quick news cycle has meant that the political system is increasingly porous to pressure and there is just no time to make thoughtful (and thus sound) decisions. On this aspect, I always give the example of the Cuban missile crisis where Kennedy spent around 3 days  without speaking to the press. That isolation probably saved the world as it allowed a compromise to be reached with the Russians. Can we expect today that Obama would enjoy the same luxury should a similar crisis occur? I am afraid to answer that one. The demise of ideologies has also meant in almost all western democracies, the political debate is more and not less virulent and personal. The first hundred days in office where a new leader would enjoy respite and almost an open hand to govern without much opposition is today a thing of the past. This all true, but I also believe that although the skills that make a successful CEO can obviously help you in office they are far from sufficient.  

In most well run companies the implementation of decisions is a fairly straight forward process. The CEO decides and it gets executed. The reason is that the incentives in the organization (normally profit related) tend to be fairly well aligned so that there is a coherence in the Principal/Agent connection. In other words, the delegation of authority necessary in every large organization still allows for Agents to faithfully follow the Principal's decision. As anyone that has worked in a large organization knows, this is not perfect (yes, welcome to the brave world of corporate politics) but is still fairly efficient in successful organizations.




Politics is, however, a different ball game. Politicians can have a hard time in executing decisions, as bureaucracies have a life of their own. Just remember that wonderful English show Yes Prime Minister and the Humphrey character and you know what I am speaking about. Politicians have tried to circumvent this problem by having larger and larger appointed cabinets (that tend to replace the higher echelons of public administration in the decision making process) but this doesn't generally solve the problem. In many cases it just gets larger because overtime it completely corrodes the quality of the public administration. In particular in countries where public service tradition and quality was lower to start with, say Southern Europe, this whole issue is even more acute. More than a decision maker in chief, a successful political leader has to be a chief persuader in chief. Authority is derived from perceived political legitimacy which is increasingly a very fickle commodity and in today's world constantly in play. CEOs are used to decide but have very little habit in persuading. In fact, the testorone laden alpha male (or female) typical CEO is much more prone to the silver bullet illusion (that one decision that will change everything) than with the slow grinding process of persuading and gradual and incremental change that is needed to implement policy. What also people tend to forget is that different technical advices can produce the same end result but just have very different political consequences depending on which constituencies you decide to piss off and in which sequence you do the piss off. Running a company is definitely a much more uni dimensional game. The last aspect, is that in politics surrounding your decisions in a coherent political narrative is paramount for success. Thinking that the time in office is just an infinite sequence of decisions which you technically address is I believe the wrong approach but one that is very familiar to the CEO frame of mind. Without an overarching political vision, decisions just get lost in the political fray.

One last word on the qualities necessary to campaign and those needed in government. With the increasing sophistication of political campaigns, none more than in the US, substance (and wisdom) quality can be an impediment to the sound bite world of campaigns. So we might be in the process of increasingly electing the wrong kind of leaders. Also, and this is particularly true in Europe, political parties are increasingly made up of just professional politicians that have hardly known anything else other than politics. The thinness of their resumes and experience are not conducive to sound public policy specially in the framework of the demoralized and diminished quality of public administrations. If one thinks about the immense challenges we all face, this is a truly depressing picture.
  
Democracies and our political systems do need to address urgently how we are selecting our leaders and how we improve the decision making process so that on, average, we get good quality decisions. Unfortunately, CEOs are no silver bullet answer to this challenge. But help is still desperately needed.

Saturday, November 24, 2012

Irracionalidades - am post





Queria escrever sobre um tema mais sério, mas não sei porquê hoje de manhã lembrei-me deste video que não resisto a partilhar para que saibam que sim, no coração de África, houve em tempos um programa espacial.

Friday, November 23, 2012

Politics do matter - am post






Com a Argentina à beira de mais um default na sua história, fica estabelecido "beyond any reasonable doubt" como o (mau) funcionamento do sistema político pode ter um impacto de longo-prazo no desenvolvimento de um país. Esta história é a simétrica daquela que se contava na Itália do pós-guerra onde as entropias do sistema político italiano, com constantes mudanças de governo, eram irrelevantes para o crescimento da economia italiana. Roma tenta governar mas a Itália continua a produzir era o que se dizia. Na Argentina, essa experiência genética de cruzamento de italianos com espanhois, isso é claramente impossível e não existe outra razão, que não a política, que explique o destino deste país com tanto potencial não realizado.

Faz dois anos, choquei com a frase acima numa estação de autocarros em Ushuaia, essa cidade que os argentinos carinhosamente apelidam de "el culo del mundo". Fiquei siderado, confesso, como uma simples frase de sete palavras pode resumir o que tudo de mal pode ocorrer num sistema político. A frase está contudo incompleta. A segunda parte que a Evita não ficou para ver, é que "y después nos jodemos todos y nos quedamos aun más necessitados que nunca".


Thursday, November 22, 2012

When you thought it could not get worse...- am post





Is Israel Preparing for a Strike in Iran?

by Moran Stern

From Operation Pillar of Cloud to the Islamic Republic's nuclear program
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Wednesday, November 21, 2012

Conflito na Terra Santa, Capítulo infinito elevado a n - pm blog




Como não deve haver alma nenhuma neste planeta, com um vago interesse sobre o mundo e gosto pela escrita, que não tenha escrito sobre este tema deixo dois livros e duas histórias que pelo menos transmitem um olhar sério e profundo sobre a história e as razões do conflito (os livros na verdade mais que as histórias).

Aqui vai a primeira história. Ela é contada pelo astrofísico Stephan Hawking. Certo dia, um seu colega durante uma palestra sobre a origem do universo, é interrompido por uma velhinha na plateia que abruptamente refere que o universo é como um disco em cima de uma carapaça de uma tartaruga. Chateado com a interrupção, e para calar a interveniente, o astrofísico contrapõe perguntando: se é assim, então a tartaruga está assente em quê? Sem se intimidar, a idosa dá a estocada final: "You are a very smart young man. But it's turtles all the way down". Ora aí está a origem o conflito na terra santa. É tanta coisa. Demografia, religião, geografia (e falta de espaço), intolerância e sim também azar (e podia continuar e continuar descendo até lá bem no fundo e só encontraria tartarugas). O crescimento populacional na região´nas últimas décadas apenas fez estes fatores mais importantes para mais gente junta. E a globalização fez isto tudo mais importante para o planeta. Depressing.


Quantos aos dois livros que falava. O primeiro é do Robert Kaplan e dá pelo título "The revenge of geography". Para além de ser um livro genial e pleno de sabedoria, os capítulos dedicados à Turquia/Médio Oriente e Irão, são de um poder de síntese e análise sobre as macro-tendências da história na região que iluminam (ao mesmo tempo que angustiam o leitor). O segundo, e para não repetir a palavra genial, é um verdadeiro tesouro de sabedoria. Chama-se "Jerusalem: the biography" do Simon Sebag Montefiore. É a história da cidade, dos primórdios dos tempos até aos nossos dias. Um monumento à erudição.


O livro mostra como em todas as eras, algo de irracional percorre esta cidade, plena de personagens singulares, eventos históricos, paixões, conflitos, massacres, etc.... Acabo com a última história, tirada deste livro. Após a guerra de 1948, Jerusalém ficou dividida e as Nações Unidas com a responsabilidade da mediação entre as duas metades da cidade. Uma das primeiras mediações foi não sobre um tema magno qualquer mas....como alimentar um tigre, um leão e dois ursos que habitavam no Zoo da cidade localizado na metade israelita. Eis o dilema: (a) se dinheiro israelita poderia servir para comprar burros arábes para alimentar as feras ou (b) se um burro israelita poderia cruzar território arábe para acabar nas bocas dos ferozes predadores. A moral da história é que, arábe ou israelita, os jumentos estavam tramados (embora também não me pareça uma dieta particularmente estimulante para as feras). Para os mais curiosos, fica a notícia que o dilema foi resolvido através da opção (b). Mas esta história diz tudo sobre as perspetivas de paz nesta terra tão disputada, não?


Crise e oportunidade

Na esteira de uma crise existem sempre oportunidades. Para Portugal e para parte da Europa esta máxima aplica-se também, por muito que as notícias de hoje possam traçar um quadro negro da realidade. De forma resumida, e pegando nos três países que já pediram ajuda ao FMI e à União Européia pode-se dizer que a Grécia sofre de um grave problema de dívida pública, a Irlanda do afundamento do seu sistema financeiro e Portugal de uma ausência de crescimento econômico que afeta a sua economia nos últimos 10 anos e que torna qualquer dívida num fardo insustentável. É por isso inevitável que o pacote de ajuda do FMI e da União Européia passe por medidas que possam levantar o potencial de crescimento econômico de Portugal. Liberalização do mercado de trabalho, privatizações, levantamento de restrições em vários setores da economia estarão inevitavelmente no topo da lista.
Para o Brasil e para as suas empresas esta pode ser uma oportunidade estratégica e de grande interesse, sobretudo no quadro da expansão internacional do seu tecido corporativo. Não que Portugal seja uma porta de entrada decisiva para a Europa já que o interesse internacional sobre o Brasil dá ao país vários caminhos à sua presença neste continente, mas como pivot da internacionalização das suas empresas nomeadamente para África.  Hoje as empresas brasileiras, pela primeira vez na sua história, são obrigadas a abraçar o caminho da internacionalização como forma de manter a sua posição em setores fundamentais da sua economia como é o caso da indústria de base e dos recursos naturais. E são obrigadas a fazê-lo num quadro de grande exigência da demanda doméstica cujo maior reflexo é talvez a escassez de quadros qualificados. É aí que Portugal e as oportunidades de aquisição de empresas que o atual momento do país propicia podem jogar um papel na criação do “Brasil Inc”. Com um pool de quadros qualificados, boas infra-estruturas, empresas com experiência e DNA internacional, nomeadamente na África de língua portuguesa, Portugal pode ser um acelerador na internacionalização das empresas brasileiras. É aí que a proximidade cultural e partilha da língua podem ser transformados de um clichê na boca dos políticos para uma verdadeira vantagem competitiva no mundo global de hoje.
Para os dois países, o triângulo América do Sul, Europa, África é o espaço onde se joga uma parte do seu futuro econômico. Para o Brasil, porque sem uma presença importante em África, o seu papel de principal fornecedor de matérias-primas que alimentam o crescimento Asiático e sobretudo chinês, poderá vir a ser ameaçado dada a riqueza de  recursos naturais deste continente e a sua maior proximidade geográfica aos mercados consumidores asiáticos. Os investimentos da Vale do Rio Doce em África devem ser vistos à luz desta perspectiva. Mas não só. Setores importantes da economia brasileira como o agronegócio, etanol e petróleo podem beneficiar de forma decisiva duma presença significativa neste continente. Basta por exemplo pensar nas semelhanças que existem na exploração de petróleo entre Angola e Brasil e o que isso significa para as empresas brasileiras do setor em termos do seu mercado potencial. Para Portugal porque isso significa ter uma presença importante num dos espaços de dinamismo econômico do século XXI. Portugal carece hoje de capital que permita alavancar a sua posição privilegiada em mercados de elevado potencial como é o caso da África. A existência de um elevado nível de endividamento quer do Estado quer das empresas portuguesas dão às empresas brasileiras oportunidades de investimento extremamente interessantes para além de reforçarem o seu acesso a fontes de financiamento européias que permitam, por exemplo, aliviar o esforço do BNDES no apoio à internacionalização das empresas brasileiras. Por outro lado, as empresas portuguesas beneficiarão não só do aporte de capital dos sócios brasileiros, mas da integração da sua presença internacional nos fluxos comerciais com o Extremo Oriente e sobretudo com a China. Por exemplo, para bancos portugueses com presença na Ásia pensar a sua atividade em termos do fluxo comercial Portugal/China ou Portugal+Brasil+África/China tem um potencial totalmente diferente.
Uma boa oportunidade nada mais é que um cruzamento entre necessidades e circunstâncias favoráveis. Temos isso hoje no momento que Brasil e Portugal enfrentam. O primeiro buscando a realização da sua promessa tanta vezes adiada e a sua afirmação como uma das principais potências econômicas do século XXI. Precisa, para além de um esforço de investimento doméstico significativo, assumir uma presença global ao nível das suas empresas à semelhança do que fazem China e Índia. Portugal procurando encontrar uma base de dinamismo econômico que permita alavancar o enorme esforço realizado nas últimas décadas no sentido de dotar o país de infra-estruturas físicas e humanas de qualidade e dotar o país de um business plan promissor.
Necessidade e circunstâncias favoráveis. A oportunidade existe. Saberemos aproveitá-la?

Valor Econômico, 05/05/2011
  

Mundo em mudança: que liderança para o Brasil?

Se existe algo em comum nos eventos deste século é o acréscimo da incerteza global, com destaque para a geopolítica, com eventos de ruptura ao status quo a sucederem-se ao longo destes doze imberbes anos do novo milênio. No meio de todas estas incógnitas sobre o futuro existem, contudo, certezas. A principal, é a diminuição acelerada do poder dos principais atores do pós XX Guerra Mundial, sejam eles os Estados Unidos e a Europa Ocidental ou a Rússia. Para as grandes economias emergentes, China, Índia e Brasil, esta é uma oportunidade de liderança embora as três demonstrem uma enorme relutância em preencher o vazio criado. Os três países são herdeiros de uma longa história de não alinhamento, de autarcia política e do seu tecido econômico, negando quase sempre posições afirmativas no contexto internacional. Dos três, o Brasil é aquele que está mais atrás no assumir de um novo papel global, sobretudo no capítulo das suas empresas, e que paradoxalmente têm algumas das condições de base mais favoráveis para assumir esse desafio.
Em primeiro lugar, o Brasil não tem rival geopolítico por perto da mesma forma que a China e Índia são rivais no mesmo espaço geográfico. Este aspecto pode parecer um pormenor, mas é importante na medida em que liberta recursos da defesa e segurança nacional para a economia e coloca menores obstáculos políticos à capacidade de influenciar o espaço geográfico regional. Em segundo, pela natureza multinacional e multiétnica da sua população. Num mundo onde as identidades são por vezes assassinas, como tão bem escreve o escritor libanês Amin Maalouf, o Brasil construiu a sua identidade feita de contribuições do mundo inteiro. Num mundo globalizado de negócios tem que contar como vantagem ter no seu seio uma comunidade com ascendência do Oriente Médio de mais de oito milhões de pessoas, só para dar um exemplo. Por outro lado, este fato dá também uma capacidade de atração de talento mundial ao Brasil que só tem rival nos Estados Unidos. Grande parte da excelência educacional deste último, por exemplo, veio de absorver talento de todo o mundo. O sucesso de Silicon Valley teria sido impossível sem a quantidade de engenheiros indianos que contribuíram para o mesmo (tendo muitos deles regressado à Índia depois e criado as suas empresas). A multiplicidade da sua população e a capacidade de integrá-la com sucesso fazem do Brasil um país bem diferente da China e Índia, ambos com problemas étnicos e religiosos profundos. O “samba dream” pode ser, pois, um motor poderoso do desenvolvimento da economia do país.
Por último, a extensão cultural do Brasil nos cinco continentes por via da língua portuguesa. Este é um aspecto que também marca uma diferença profunda do Brasil face à China e Índia. O aproveitamento com sucesso deste trunfo pode dar uma contribuição decisiva para internacionalização das empresas brasileiras e da sua economia e dá ao país uma capacidade de intervenção ímpar no Continente Africano, peça essencial da geopolítica do século XXI. Basta pensar em Moçambique e do seu potencial para ser a porta do Índico de toda uma região rica em recursos naturais e indústria e onde o investimento brasileiro é já significativo. Para isso o Brasil precisa assumir como sua a condução de uma “Commonwealth” do mundo Português...só que feita pela ex-colônia em vez de pela  Metrópole.  Da mesma forma que o processo de independência do país tem contornos únicos na história mundial, também aqui o Brasil pode inovar e assumir aquilo que hoje Portugal não tem hoje capacidade de fazer. Existe uma base que é a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), mas é necessário dar-lhe muito mais conteúdo. O Brasil representa mais de 80% do PIB de toda a CPLP. Estender, por exemplo, a consideração de incorporação nacional do setor do petróleo para subsidiárias de empresas do país situadas no espaço da CPLP pode resolver muitos gargalos do programa de investimentos da Petrobrás, ancorar a internacionalização das empresas e ajudar no aproximar da fileira de serviços de petróleo brasileira à angolana aumentando o mercado potencial das empresas que servem a Petrobrás. Á semelhança da Índia e da China, o Brasil precisa criar as suas empresas globais num conjunto de setores importantes e mais do que barreiras e quotas, este é o caminho que terá mais efeitos em longo prazo no aumento de competitividade das empresas no mercado doméstico.
África é hoje, e bem, uma prioridade da política externa do país. É o continente que está entre o Brasil e os seus principais clientes, nomeadamente a China, e partilha com o Brasil muitas características onde o país foi ímpar a explorar como perfil agrícola e de recursos naturais. Dar corpo econômico à realidade da CPLP pode ser por isso um poderoso trampolim de liderança para o Brasil num espaço que já é hoje objeto prioritário da concorrência internacional. Sem esquecer que Portugal tem ociosos no presente recursos humanos e industriais em muitos setores que podem ajudar e muito na competitividade internacional e doméstica das empresas brasileiras.
Capturar talento pelo mundo, internacionalizar as empresas, aproveitar as ligações informais das suas comunidades imigrantes são as cartas que o Brasil tem ao seu dispor para também ele liderar este mundo em mudança. Agora é só jogá-las.

Valor Econômico, 10/08/2012

Samba Dream


Visto de um Portugal depressivo e em crise de confiança, o Brasil parece ser hoje a miragem da terra prometida. Os Estados Unidos do mundo da língua portuguesa, finalmente concretizando a sua promessa sempre adiada de prosperidade, substituindo o querer pelo fazer e dando a si próprio e ao resto do mundo a sua própria versão do sonho americano. É sobre este signo que se iniciaram este mês as comemorações do ano de Portugal no Brasil, em que o primeiro vê o segundo como um "canivete suíço" económico quase milagroso. Como o mercado para a suas exportações, a solução para a venda das suas empresas e a porta de colocação dos seus quadros.

Se olharmos para a história recente dos dois países, o momento atual representa uma inversão extraordinária daquilo que se passou na segunda metade dos anos 90. Aí os dois países se olhavam de uma maneira completamente diferente. Portugal estava no seu momento "Escandinávia", com as fichas todas colocadas na Europa e a convição que se tinha colocado definitivamente na primeira divisão do Continente e o Brasil vivia a realidade da montanha russa que sempre caracterizou o país sem ainda ter tomado consciência de como o consulado de Fernando Henrique Cardoso iria alterar o rumo da nação. O início da emigração brasileira para Portugal e a tomada de posições significativas no mercado brasileiro das maiores empresas portuguesas pareciam confirmar como definitiva esta percepção de ambos os lados do Atlântico.

Só que nem a realidade dos anos 90 se prolongou muito no tempo, nem o atual momento de Portugal é eterno. Aliás, os próprios brasileiros são os primeiros céticos do seu próprio sucesso, vacinados que estão pela história do país, como, pelo mesmo conjunto de razões, nos olham com um misto de estupefação e incredulidade por acharmos que o mundo está a acabar quando temos uma boa qualidade de vida, segurança, transportes públicos que funcionam, segurança social, etc...

Assim, olhar para o ano de Portugal no Brasil, e para as suas relações económicas, submergido pela espuma do atual momento dos dois países é capaz de não ser a atitude mais aconselhável nem a mais proveitosa. Partindo de fatos, existem, porém algumas certezas. A primeira é que a ascendência do Brasil a um patamar compatível com a sua dimensão é uma certeza. Isso não quer dizer, contudo, que o país será um país desenvolvido ou rico no longo prazo. O Brasil, à semelhança dos outros grandes países emergentes, enfrenta nas próximas, eu diria duas décadas, o desafio de enriquecer antes de envelhecer ou envelhecer antes de enriquecer. O Brasil vive na plenitude o seu bónus demográfico, e este tem sido ao longo da história, um dos grandes fatores explicativos de um crescimento económico de um país acima da sua média de longo prazo. Foi assim na Europa e Estados Unidos do pós II Guerra Mundial e na China dos últimos 20 anos. Brasil e Índia estão agora a começar a utilizar este poderoso ingrediente do crescimento económico. É mais fácil imaginar este processo como um surfista que apanhou uma onda poderosa. Se chega ou não à praia é uma pergunta que só terá resposta daqui a alguns anos. Assim, não, o momento do Brasil não é fugaz nem vai terminar amanhã, mas tampouco é definitivo e eterno. Por outro lado, à semelhança da China, Índia, Turquia e Indonésia (não, não acredito na Rússia como ator de futuro), para citar os mais importantes, o Brasil vai ser um ator importante da cena política internacional desempenhando um papel regional e global condizente com a sua dimensão continental e com um novo equilíbrio internacional que terá necessariamente de ser desenhado na sequência do declínio relativo de Europa e Estados Unidos. Isso demorará algum tempo, até porque o Brasil terá ainda de se libertar de alguns mitos fundadores da sua política externa ainda muito ligada ao movimento dos não alinhados e a uma cosmologia dos anos 60, e também avançar na internacionalização da sua economia e das suas empresas. Estes passos estão a ser dados, mas como é natural demoram tempo a ocorrer.       

E é precisamente nesta transformação do Brasil como ator global que a relação com Portugal pode ser útil a este e naturalmente permitir a Portugal colher benefícios da relação bilateral. Em primeiro lugar porque o laço linguístico e cultural é indissolúvel e neste aspecto, o Brasil é, aliás, um defensor mais acérrimo da língua portuguesa na cena global que o nosso próprio país. Por outro lado, o Brasil, pela sua importância crescente a nível global, não precisa, como é óbvio, de Portugal como porta de entrada para lado nenhum sendo que este é às vezes é também um dos mitos da nossa política externa. Contudo, os quadros e as empresas portuguesas podem ser plataformas muito interessantes para as empresas brasileiras na sua expansão internacional transformando-as de um dia para outro de empresas grandes, mas confinadas ao seu mercado doméstico, em empresas com um cariz mais global. Não só para África, e, sobretudo a de língua portuguesa, que é uma das prioridades da política externa do Brasil, mas igualmente para outros mercados. O exemplo da Cimpor pode ser, aliás, emblemático desta nova realidade. Quanto ao peso de Portugal e das suas empresas no Brasil, é preciso ser realista e reconhecer que o momento dos anos 90 é não é repetível. A dimensão da economia brasileira e a consequente valorização dos seus ativos tornam isso evidente. Isso não quer dizer, no entanto, que o Brasil não seja um mercado atrativo e de êxito para as empresas nacionais. Terão sucesso todas aquelas empresas que reconhecerem a enorme exigência do mercado, a sua complexidade e a consequente necessidade de foco, a sua diferença de cultura de negócios com Portugal apesar da língua comum e a necessidade de planos de capital que tenham em conta que levantar dívida no Brasil é difícil para recém-chegados, só para citar algumas verdades.

Jornal Público, 09/09/2012

Europa 0.0

A Europa enquanto projeto tecnocrático vive hoje uma agonia quase terminal. A realidade política que, na cabeça de homens como Adenauer, Monnet e outros, a construção européia iria domar revoltou-se. Não, a crise do Euro não é a causa por muito que a narrativa do presente assim o aponte, mas o sintoma de algo mais profundo que é o estilhaçar do verniz do interesse comum deixando a nu a diversidade das lógicas nacionais que afinal sempre foram o motor da evolução política européia. Por mais de 50 anos, os diferentes interesses das principais nações européias e, sobretudo o mais determinante deles que é o alemão, coincidiram em olhar para o projeto europeu como o veículo das suas ambições políticas e de bem estar dos seus povos. Se pensarmos nos ingredientes essenciais que foram necessários à concretização da velha visão das elites sobre uma Europa unida, fica óbvia essa realidade. O primeiro resulta da limpeza étnica que duas guerras mundiais proporcionaram e que “arrumaram” as populações nas suas casas naturais. Nações e fronteiras políticas passaram a ter uma coincidência quase total dando a necessária segurança aos diferentes Estados para entrarem num processo de partilha de soberania. Eu sei que é irônico este começo se pensarmos no que supostamente a União Europeia representa, mas a ironia não o faz menos verdadeiro. O segundo foram os meios obtidos para a construção do Estado social europeu a partir da união de alguns setores de base na Europa como a agricultura, o carvão e que permitiu “comprar” a estabilidade política dos diferentes estados europeus. Foram as décadas de glória do centrismo social democrata europeu. Por último a segurança. Não só traduzida na unificação do bloco ocidental face à ameaça soviética, mas como, e ainda mais importante, na resolução da questão alemã pela... amputação da própria Alemanha. Do lado de cá, ficava a face mercantil, progressista, herdeira da liga hanseática e suficientemente pequena política e geograficamente para ser gerida, e do lado lá as pulsões expansionistas dos junkers prussianos. Nada mais perfeito e de tão equilibrado que parecia o resultado que o mesmo tinha ares de imutabilidade.
Olhando agora para hoje, a solução da presente crise, do ponto de vista técnico, é espantosamente simples. Suportar a União Monetária através de verdadeiros mecanismos federais ao nível da dívida, bancos, etc...Foi afinal o que Alexander Hamilton fez nos Estados Unidos e que foi uma das pedras basilares da nova nação. Se a solução técnica é simples ela é, contudo, simplesmente impraticável do ponto de vista político na Europa de hoje. E para ver esta impossibilidade política nada melhor do que pensar na Itália. No melhor dos cenários, a federalização da dívida europeia levaria à criação de um Mezzogiorno alargado ao nível do Sul da Europa suportado por um tempo indeterminado por transferências do Norte mais produtivo. Mesmo dentro de um mesmo país estes arranjos são dificilmente sustentáveis, sobretudo em tempos de crise, bastando para isso olhar também para o caso recente da Espanha e a rebelião constitucional da Catalunha.
 E porquê esta longa introdução? Porque as origens desta impossibilidade estão de fato na política. O projeto da moeda única vem de antes da reunificação alemã e foi utilizado como o quid pro quo final para a aceitação por parte, sobretudo da França, dessa mesma reunificação na procura febril de ancorar definitivamente a Alemanha reunificada no projeto europeu.  Mas a fraqueza desta solução está hoje à vista. Em primeiro lugar, porque ela não foi legitimada no voto, nomeadamente na própria Alemanha. Depois, porque a reunificação alemã e a aceleração da globalização econômica fizeram divergir aquilo que seria o interesse do projeto europeu dos interesses dos principais Estados seus constituintes, sendo que os três principais ingredientes que estiveram na origem da União deixaram de funcionar de forma harmoniosa passando a estar em conflito entre si.
 Os Estados europeus vivem hoje uma enorme insegurança da sua identidade étnica, traduzida na enorme dificuldade em integrar imigrantes numa altura em que a falta de vitalidade demográfica do continente aconselharia precisamente o contrário. Aqui, a existência de Estados fortemente alicerçados em prestações sociais torna ainda mais difícil essa integração ao reforçar o mito dos imigrantes enquanto parasitas sociais e não como fator gerador de riqueza, idéias e sim, também de jovens. As dificuldades porque passa o acordo de Schengen são apenas um reflexo desta realidade. Por outro lado, temos a enorme dificuldade de financiamento do Estado social que a Europa já não consegue proteger dos ventos da globalização e que a presente crise apenas acelerou a constatação da inviabilidade econômica. Em terceiro lugar, a questão da segurança onde o interesse europeu ditaria como fundamental a integração da Turquia na União Europeia, um país que pela sua versão moderna do Islão em muito poderia contribuir para uma interação de sucesso da Europa com a sua fronteira sul e para uma integração com menos complexos da maior minoria religiosa da Europa. O epíteto do Império Otomano no início do século XX era o “o doente da Europa”. Hoje, para a elite turca, os doentes somos nós europeus e temo que esta oportunidade já não volte.
E por último temos a questão alemã. Com a unificação da Alemanha e a emergência de uma nova geração desligada do passado da II Guerra Mundial, a ligação natural do que é bom para a Europa é bom para Alemanha está kaput. E era sobre esse pilar que, em última análise, todo o edifício do Euro foi construído.  Olhar hoje para a crise do Euro e achar que a crise é resolúvel apenas porque o custo do seu término é muito elevado é padecer da mesma ilusão que existia antes da I Guerra Mundial quando políticos, economistas, fazedores de opinião e o próprio mercado financeiro exclamavam no Verão de 1914 que a guerra era impossível, pois os interesses econômicos comuns e o custo em termos de prosperidade seria demasiado elevado. Uma geração dizimada depois e com a Europa de rastos, eles tinham razão sobre os custos, mas essa racionalidade não foi barreira suficiente para prevenir o conflito. Da mesma forma, a realidade política alemã irá ditar o futuro do Euro, mesmo que ela contradiga o racional de uma análise custo benefício.  
Jens Weldemann, Presidente do Bundesbank, criticou recentemente as decisões do Banco Central Europeu para salvar o Euro usando isso a peça Fausto, obra prima de Goethe, e o diálogo de Mephistópheles com o Imperador a propósito da criação monetária. Para além de comprovar que no mundo protestante, e sobretudo alemão, a política econômica é um braço da filosofia moral, este exemplo traduz na perfeição a visão alemã sobre as origens e a forma de resolução da crise na Europa. Os outros países, sobretudo os do Sul, poderiam contrapor com Shakespeare e a peça Mercador de Veneza, onde Shylock, o mercador judeu (ironia das ironias não é verdade...), apenas aceita receber em pagamento do seu empréstimo uma libra de carne do corpo do devedor, o pobre António. Sem que o cimento do interesse comum seja explicado aos eleitores, estas duas visões nunca serão compatíveis. É esta a verdadeira razão da crise da Europa.
Jornal Publico, 07/10/2012

Ao Ritmo das Monções

The Monsoon of which I speak about is more than a storm system...; it is, too, a life affirming and beneficial climatic phenomenon, so necessary over the centuries for trade, globalization, unity, and progress.
Robert Kaplan, "Monsoon: the Indian Ocean and the future of American power"
África está num ressurgimento de importância. De uma forma ainda difusa existe algo que se está passar. Aquilo que foi no século XIX o “Great Game”, essa competição por recursos e presença geográfica entre Grã-Bretanha e Rússia no triângulo que vai do Hindu Kush, Mar Negro e as planícies da Ásia Central, desenrola-se hoje em África ditada pela procura de commodities para alimentar a voragem das novas potências econômicas do Oriente encabeçadas pela China. Mas não é só a China que está nesse jogo. Ainda no ano de 2011, a Índia aprovou a criação de uma agência de desenvolvimento e cooperação que tem como objetivo colocar a Índia no mapa de África. Tendo perdido para o seu grande competidor alguns espaços cruciais de matérias-primas mais perto de casa como é o caso da Birmânia, a Índia pretende que a história não se repita em África. A outra grande potência emergente, o Brasil, procura também ocupar o seu espaço no Continente alavacando as suas ligações por via do mundo da língua portuguesa para garantir uma presença mais próxima do seu mercado principal, a China. Este processo de aumento da importância do continente africano teve a sua origem com aquilo que os economistas classificam como “commodity super cycle” que se iniciou no virar deste século. Temos mais uma daquelas coincidências que nos faz pensar que este século tem características muito parecidas com o fim do século XIX e início do século XX.  Uma potência ainda dominante, mas perdendo a sua hegemonia (na altura o Reino Unido, hoje os Estados Unidos), uma potência hegemónica em ascensão, mas ainda incapaz de assumir liderança (na altura os Estados Unidos, hoje a China), corrida aos recursos naturais numa ótica mercantilista, emergência do fenômeno terrorista como instrumento de intimidação da população civil (na altura com a bandeira do anarquismo, hoje com a da religião) só para citar algumas semelhanças.
Voltando a África este renovado interesse sobre o continente surgiu em boa hora, pois se houve continente que perdeu claramente com o final da guerra fria foi o continente africano que se viu condenado à marginalidade política e ficou isolado da enorme vaga da globalização que se iniciou nos anos 90. É bom recordar que todo o processo de independências no Continente ocorre tendo como pano de fundo a disputa entre Estados Unidos e a União Soviética que procuravam arregimentar para o seu campo os novos países que surgiam fruto da descolonização. Finda a Guerra Fria, a África caiu na gaveta dos fundos da geopolítica, ganhando visibilidade apenas de quando em quando por algum acontecimento capaz de atrair a curiosidade dos media como a eleição de Nelson Mandela, o genocídio do Ruanda, só para citar dois exemplos. Com a independência tornou-se também evidente o caráter superficial da colonização, que apenas foi plena nos últimos 50/60 anos da sua existência, expressa na imensa diferença entre a capital e o mundo rural da generalidade dos países africanos e o esforço administrativo muito acima da sua capacidade em criar uma unidade administrativa nos seus territórios. A Costa do Marfim e a Nigeria, para dar dois exemplos, quiseram ligar artificialmente esses dois mundos criando uma nova capital, Yamassoukro e Abuja, no interior dos seus países, pretendendo substituir as suas antigas capitais e verdadeiros centros de comercio na costa, Abidjan e Lagos. Falharam neste objetivo e esta dicotomia e desconexão entre cidade, sobretudo a capital, e o mundo rural foi durante décadas das características mais disfuncionais da realidade política, económica e social africana.
Em vários planos esta realidade está em mudança. Em termos políticos, a morte da geração de líderes educados pelo regime colonial que encabeçaram a luta pela independência fez emergir toda uma nova classe política mais comprometida com o desenvolvimento econômico. Por outro lado, a alteração dos termos de troca de muitas economias africanas, com o aumento de preço dos recursos naturais e agrícolas, finalmente está permitir a constituição de um excedente econômico no mundo rural que permita suportar uma maior urbanização necessária para a solidez administrativa e política destes países. Também a tecnologia tem desempenhado um papel fundamental ao permitir o encurtar de caminho para o desenvolvimento econômico. Por exemplo, antes da cobertura de telefone fixo na totalidade do território, muitos países africanos conhecem o telemóvel disponível nas suas zonas mais remotas. O Quénia possui dos sistemas de mobile banking mais avançados do mundo. Durante alguns anos, pensou-se que o ressurgimento de África passaria, sobretudo pela África do Sul, uma economia maior que o resto da África subsaariana toda junta. Sem desprezar a importância do país, hoje a história gira principalmente a partir do ressurgimento do Índico enquanto pólo de comércio retomando a sua importância econômica que vêm de antes do Império Romano. No arco que começa em Durban, sobe pela costa leste africana, e percorre todo o Índico até à Indonésia existe uma tradição de comércio que se estendeu na região de mãos dadas com o Islão, uma diáspora empreendedora de origem indiana com laços familiares e culturais que atravessam todo o Índico. É a partir da costa Oriental africana que os imensos recursos naturais do centro do Continente irão ser escoados para alimentar o crescimento de toda a Ásia, em particular os colossos chinês e indiano. Nesta nova geopolítica, e olhando para o mundo da língua portuguesa, Moçambique é um ator bem mais central que Angola. A globalização não chega pois à África. Regressa a ela pelos mesmos caminhos trilhados durante séculos ao ritmo das Monções que faziam ser mais rápido cruzar o Índico do que o Mediterrâneo. Esta é a nova fronteira do desenvolvimento económico.